O direito de preferência consiste essencialmente no direito de certas pessoas terem prioridade na celebração de um negócio.
Não gera uma obrigação de celebrar um negócio, mas de lhes possibilitar o exercício do direito de celebrar um negócio nas condições em que um negócio iria ser celebrado com um terceiro.
Havendo violação, poderá o pretenso preferente exigir uma indemnização a anulação do negócio celebrado, com vista a adotar a posição de adquirente nas mesmas condições.
Existe uma panóplia de situações em que podemos encontrar este direito, ficando o preferente diversas vezes "prejudicado" (ou "não beneficiado"), por desconhecimento desse seu direito.
Assim, passamos a evidenciar algumas situações concretas:
1 - ARRENDAMENTO
1.2 – ARRENDAMENTO RURAL
2 - LOJAS HISTÓRICAS
3 - CÂMARAS MUNICIPAIS, REGIÕES AUTÓNOMAS OU ESTADO
4 – TRESPASSE
5 - PRÉDIOS RÚSTICOS
5.1 – POR ÁREA
5.2 – POR ENCRAVAMENTO
5.3 - POR LOCALIZAÇÃO EM ZONA RAN
6 – HERANÇA
7 - SOCIEDADES
8 - CONVENCIONAL
9 - CÔNJUGE SOBREVIVO
10 – Nota Final: Breve distinção relativamente ao Direito de remissão
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1 - ARRENDAMENTO
Nos termos do disposto no n.º 1 do art. 1091.º do Código Civil, o arrendatário tem direito de preferência nas seguintes situações:
a) Na compra e venda ou dação em cumprimento do local arrendado há mais de dois anos, exceto no caso de arrendamento relativo a parte de prédio não constituído em propriedade horizontal;
b) No caso de contrato de arrendamento para fins habitacionais relativo a parte de prédio não constituído em propriedade horizontal, o direito é relativo à quota-parte do prédio correspondente à permilagem do locado pelo valor proporcional dessa quota-parte face ao valor total da transmissão e a aquisição pelo preferente é efetuada com afetação do uso exclusivo da quota-parte do prédio a que corresponde o locado.
c) Na celebração de novo contrato de arrendamento, em caso de caducidade do seu contrato por ter cessado o direito ou terem findado os poderes legais de administração com base nos quais o contrato fora celebrado.
- cfr. art. 1091.º do C.C:.
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1.2 – ARRENDAMENTO RURAL
De acordo com o disposto nos n.ºs 1 e 2 do art. 31.º do Decreto-Lei n.º 294/2009, de 13 de Outubro (NRAR), quanto ao arrendamento rural quando ocorrer a cessação do contrato de arrendamento por causa não imputável ao arrendatário, o arrendatário goza do direito de preferência nos contratos de arrendamento celebrados nos cinco anos seguintes.
Já no caso de venda ou dação em cumprimento de prédios que sejam objeto de arrendamento agrícola ou florestal, cujo contrato vigore há mais de três anos, os arrendatários terão direito de preferência.
Já de acordo com o disposto nos n.ºs 4 e 5 do referido artigo, caso decida exercer o direito de preferência, o arrendatário terá que explorar o prédio como seu proprietário durante, pelo menos, cinco anos, salvo caso de força maior, sob pena de ser obrigado a pagar ao anterior proprietário o valor equivalente ao quíntuplo da última renda vencida e a transmitir a propriedade ao preterido com o exercício da preferência, se este o desejar, pelo preço de aquisição do prédio
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2 - LOJAS HISTÓRICAS
De acordo com a Lei n.º 42/2017, de 14 de Junho, que determina o regime de reconhecimento e proteção de estabelecimentos e entidades de interesse histórico e cultural ou social local, além das demais regras gerais aplicáveis,
a) Os arrendatários de imóvel em que esteja situado estabelecimento ou entidade reconhecidos como de interesse histórico e cultural ou social local gozam de direito de preferência nas transmissões onerosas de imóveis, ou partes de imóveis, nos quais se encontrem instalados, permitindo obter o direito de preferência quanto ao imóvel / prédio global; e
b) os municípios gozam de direito de preferência nas transmissões onerosas de imóveis, ou partes de imóveis, nos quais se encontrem instalados estabelecimento ou entidade reconhecidos como de interesse histórico e cultural ou social local
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3 - CÂMARAS MUNICIPAIS, REGIÕES AUTÓNOMAS OU ESTADO
Poderão ter o direito de preferências, nomeadamente, as Câmara Municipais, Regiões Autónomas ou o Estado, caso os imóveis se tratem de imóveis que se encontrem nas seguintes circunstâncias:
a) Numa zona de pressão urbanística, delimitada com fundamento na falta ou desadequação da oferta, nos termos previstos no artigo 2.º-A do Decreto-Lei n.º 159/2006, de 8 de agosto, na sua redação atual;
b) Em territórios identificados no Programa Nacional de Habitação com fundamento na falta ou desadequação da oferta referida na alínea anterior.
(cfr. art. 6.º do Decreto-Lei n.º 89/2021, de 03 de Novembro)
Para tanto, deverá ser publicado o anuncia no sitio online da plataforma “Casa Pronta”, através do link https://www.casapronta.pt/CasaPronta/preferencias/PrePasso1.jsp.
Após publicação (e pagamento dos respetivos custos que atualmente correspondem a €15,00), as entidades que beneficiem do direito de preferência poderão exercer o mesmo no prazo de 10 dias. – cfr. n.º 2 do art. 7.º do Decreto-Lei n.º 89/2021, de 03 de Novembro.
De frisar que, nos termos do disposto no n.º 4 do art. 37.º da Lei n.º 83/2019, de 3 de setembro (Lei de bases da habitação) “O direito de preferência das entidades públicas não prejudica o direito de preferência dos arrendatários habitacionais na compra e venda ou dação em cumprimento do locado onde residam, cabendo à lei estabelecer a respetiva graduação.”
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4 – TRESPASSE
No caso de Trespasse – geralmente definido por transferência definitiva, global ou unitária, total ou parcial do estabelecimento comercial ou industrial, o senhorio tem direito de preferência no trespasse por venda ou dação em cumprimento, salvo convenção em contrário. – cfr. n.º 4 do art. 1112.º do C.C.
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5 - PRÉDIOS RÚSTICOS
5.1 – POR ÁREA
De acordo com o disposto no n.º 1 do art. 1380.º do C.C. no caso de terrenos confinantes de área inferior à unidade de cultura, os proprietários de terrenos confiantes gozam do direito de preferência no caso de venda, dação em cumprimento ou aforamento de qualquer dos prédio, em relação a quem não seja proprietário confinante.
Já no caso de existirem vários proprietários com direito de preferência, caberá este direito, no caso de prédio encravado, ao proprietário onerado com servidão de passagem e, nos demais casos, ao proprietário que, pela preferência, obtenha a área que mais se aproxima da unidade de cultura fixada para a respetiva zona.
Em caso de igualdade, abrir-se-á licitação entre eles, revertendo o excesso para o alienante.
- cfr. n.ºs 2 e 3 do art. 1380.º do C.C.
Para compreender a unidade de cultura a ter em consideração dever-se-á considerar-se o Anexo II da Portaria n.º 219/2016, de 9 de agosto, na redação atual.
Nesse âmbito, de frisar que, em temos genéricos,
a) em relação ao terreno de sequeiro, estes são os que não dispõem de qualquer sistema de rega, ou seja, de aproveitamento de águas, incluindo águas pluviais.
b) já os terrenos de regadio são aqueles que dispõem de tais sistemas, que permitem o aproveitamento tanto de águas próprias como alheias.
c) para determinar a classificação a atribuir/considerar, deverá considerar-se a cultura predominante que se pratica no terreno à data da celebração do negócio jurídico.
Este preceito deverá conjugar-se com o n.º 1 do art. 18.º do Decreto-Lei n.º 384/88, de 25 de outubro, de maneira a que a verificação do direito de preferência esteja essencialmente dependente de que um dos prédios tenha área inferior à unidade de cultura.
Este direito não se verificará caso algum dos terrenos constitua parte componente de um prédio urbano ou se destine a algum fim que não seja a cultura ou quando a alienação abranja um conjunto de prédios que, embora dispersos, formem uma exploração agrícola de tipo familiar. – cfr. als. a) e b) do art. 1381.º do C.C..
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5.2 – POR ENCRAVAMENTO
Nos termos do disposto no n.º 1 do art. 1555.º, o proprietário de prédio onerado com a servidão legal de passagem tem direito de preferência (já constituída, ainda que através do instituto de usucapião!), no caso de venda, dação em cumprimento ou aforamento do prédio dominante.
Já nos termos do n.º 3 do referido artigo, havendo uma pluralidade de preferentes, abrir-se-á entre eles licitação, revertendo o excesso para o alienante.
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5.3 - POR LOCALIZAÇÃO EM ZONA RAN
Nos termos do disposto no n.º 1 do art. 26.º do Decreto-Lei n.º 73/2009, de 31 de Março [Regime Jurídico da Reserva Agrícola Nacional] "Sem prejuízo dos direitos de preferência estabelecidos no Código Civil e em legislação complementar, os proprietários de prédios rústicos ou mistos incluídos numa área da RAN gozam do direito de preferência na alienação ou dação em cumprimento de prédios rústicos ou mistos confinantes".
Recordamos que o conceito de prédio misto encontra-se plasmado no art. 5.º do CIMI nos seguintes termos:
"1- Sempre que um prédio tenha partes rústica e urbana é classificado, na íntegra, de acordo com a parte principal.
2 - Se nenhuma das partes puder ser classificada como principal, o prédio é havido como misto."
Já os n.ºs 2 e 3 do referido art. 26.º determinam que "Os proprietários dos prédios rústicos ou mistos inseridos na RAN que os pretendam vender, comunicam por escrito a sua intenção aos confinantes que podem exercer o seu direito nos termos dos artigos 416.º a 418.º do Código Civil", bem como que, "No caso de violação do prescrito nos números anteriores é aplicável o disposto no artigo 1410.º do Código Civil, exceto se a alienação ou dação em cumprimento tiver sido efetuada a favor de um dos preferentes."
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6 – HERANÇA
Nos termos do disposto no n.º 1 do art. 2130.º do C.C,. no caso de venda ou dação em cumprimento a estranhos de um quinhão hereditário, os co-herdeiros gozam do direito de preferência nos termos em que este direito assiste aos comproprietários (com a diferença de que o prazo para exercer o direito, que, nos termos do n.º 2 do referido art., será de 2 meses).
De frisar, no entanto, que este direito diz respeito a um quinhão hereditário (fração da quota a que o herdeiro tem direito) e não quanto à alienação de um concreto bem compreendido na herança indivisa.
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7 - SOCIEDADES
Relativamente às sociedades por quotas, no caso de venda ou adjudicação judicial de uma quota, terão preferência os demais sócios e, subsequentemente, a sociedade ou pessoa por esta designada.
Por sua vez, quanto às sociedades anonimas, nos termos do n.º 1 do art. 367.º do C.S.C., em relação à subscrição de obrigações convertíveis em ações da sociedade (cfr. art. 365.º C.S.C.), os acionistas têm direito de preferência; e nos termos do n.º 1 do art. 458.º do C.S.C., relativamente ao aumento de capital, em cada aumento de capital por entradas em dinheiro, as pessoas que, à data da deliberação de aumento de capital, forem acionistas podem subscrever as novas ações com preferência relativamente a quem não for acionista.
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8 - CONVENCIONAL
Além das situações legalmente previstas, das quais acima se fez uma sucinta referência, é possível ainda convencionar um pacto de preferência, através do qual alguém assume a obrigação de dar preferência a outrem na venda (ou prestação de facto) de determinada coisa. (cfr. art. 414.º C.C.).
Desta forma, poderá um outorgante obrigar-se a dar preferência a um outro na venda de determinado bem ou prestação de serviço.
Esta convenção/acordo deverá reverter a forma do negócio a concretizar (por ex., no caso de compra e venda de bem imóvel, deverá ser outorgado através de escritura pública ou documento particular autenticado.
Em princípio, terá natureza obrigacional apenas, gerando a responsabilidade de pagamento de uma indemnização, não podendo opor a terceiros. No entanto, caso o direito de preferência diga respeito a bens imóveis sujeitos a registo, tenha sido convencionada a eficácia real por declaração expressa, e o direito tenha sido registado nos termos legalmente previstos, poderá então ter natureza real. (quanto ao último dos três pressupostos, em relação aos imóveis, cfr. al. f) do n.º 1 do art. 2.º do Código do Registo Predial)
Encontram-se ainda previstas situações em que, nos termos da lei, se abre a possibilidade expressa de estabelecer direitos de preferência, como sucede, por ex., no âmbito do contrato de sociedade em que se podem estabelecer direitos de preferência dos outros acionistas no caso de alienação de ações nominativas (cfr. al. b) do n.º 2 do art. 328.º do C.S.C.)
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9 - CÔNJUGE SOBREVIVO
Nos termos do disposto no n.º 9 do art. 1707.º do C.C. o cônjuge sobrevivo tem direito de preferência em caso de alienação do imóvel - casa morada de família enquanto o cônjuge entretanto falecido era sobrevivo - e durante o tempo em que o habitar, independente do título a que for.
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10 – Nota Final:
Breve distinção relativamente ao Direito de remissão
Ainda que relativamente semelhante, o direito de preferência distingue-se do direito de remissão, sendo uma das principais diferenças o facto de que, neste último, inexiste a obrigatoriedade de notificação para exercer tal direito.
Assim, visando a tutela do património familiar, este direito de remissão pertence em primeiro lugar ao cônjuge, em segundo lugar aos descendentes e em terceiro lugar aos ascendentes do executado, prevalecendo sobre o direito de preferência (cfr. n.º 1 do art. 844.º e n.º 1 do art. 845.º, ambos do C.C.).
Caberá, pois, ao remidor informar aos autos de que pretende exercer o direito de remissão nos seguintes prazos:
“No caso de venda por propostas em carta fechada, até à emissão do título da transmissão dos bens para o proponente ou no prazo e nos termos do n.º 3 do artigo 825.º;
Nas outras modalidades de venda, até ao momento da entrega dos bens ou da assinatura do título que a documenta.”
(cfr. art. 843.º C.C.)
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