Em termos jurídicos, e na verdadeira aceção da palavra (para o que realmente releva), estipula o art. 1207.º do Código Civil que “Empreitada é o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço”, podendo tratar-se de uma construção (nova), de reparação ou de modificação de obra, esta móvel ou imóvel.
Sem aprofundar muito o regime jurídico, por transcender o objeto de análise, de acordo com o disposto no art. 1208.º do C.C. “O empreiteiro deve executar a obra em conformidade com o que foi convencionado, e sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato”, e, de acordo com o disposto no art. 762.º do Código Civil, “No cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé.”
Quando se verifiquem defeitos na obra, deverá o dono de obra acautelar diversos prazos para exercer os seus direitos, sob pena de ver os seus direitos ficarem precludidos, bem como exigir cabalmente o meio idóneo a salvaguardar os seus interesses.
No presente artigo, o foco recairá essencialmente sobre as empreitadas em bens IMÓVEIS (destinados a longa duração), devendo ser analisado o mesmo tendo por referência tal “limitação”.
De frisar que os prazos e a hierarquia de soluções passíveis de aplicar em face de incumprimentos ou defeitos de obra nas empreitadas de imóveis destinados a longa duração variarão essencialmente mediante o dono de obra seja ou não um consumidor.
Assim, caso o dono de obra não seja um consumidor, e caso os defeitos apenas tenham sido conhecidos posteriormente, deverão ser considerados os seguintes prazos:
a) O dono de obra deverá denunciar os defeitos/desconformidade da obra no prazo máximo de um ano após os detetar, e deverão ocorrer no prazo de cinco anos após a entrega da obra (ou aquele que for convencionado entre as partes) (n.º 1 e n.º 2 do art. 1225.º do C.C.).
b) Após, o dono de obra deverá, primeiramente, exigir a eliminação dos defeitos/desconformidades (n.º 1 do art. 1221.º do C.C.)
c) Se a eliminação dos defeitos não for possível, o dono de obra deverá exigir uma nova construção (n.º 1 in fine do art. 1221.º do C.C.)
d) Caso não se verifique nenhuma das possibilidades que antecedem, o dono de obra terá direito à redução do preço, em termos proporcionais, e nos termos previstos para os contratos de compra e venda (n.º 1 do art. 1222.º do C.C.)
e) Por fim, poderá o dono de obra exigir a resolução do contrato, se os defeitos tornarem a obra inadequada ao fim a que se destina (n.º 1 in fine do art. 1222.º do C.C.).
O exercício destes direitos, pela ordem indicada, deverá ocorrer no prazo de um ano a partir da denúncia. Isto, na certeza de que o exercício de qualquer um destes direitos, nos termos legalmente previstos, não obsta o direito de ser indemnizado, conforme expressamente prevê o art. 1223.º do C.C., devendo exercer esse direito igualmente no ano seguinte à denúncia (n.º 2 do art. 1225.º do C.C. in fine).
E deverá ocorrer pela ordem aqui indicada.
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Já caso o empreiteiro seja um consumidor (na aceção do n.º 1 do art. 2.º da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho e conforme al. a) do n.º 1 do art. 1.º-B do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril, segundo o qual “Considera-se consumidor todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios.”) será de considerar o disposto em lei específica, concretamente o Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de abril.
Em termos práticos, tal implica que, ao contrário do que sucede caso o dono de obra não seja consumidor, deverão ser considerados os seguintes prazos:
O empreiteiro será responsável pelos defeitos que se verifiquem numa obra no prazo de cinco anos, após entrega da obra (n.º 1 do art. 5.º do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril);
O dono de obra deverá denunciar os defeitos/desconformidade da obra no prazo máximo de um ano após os detetar (n.º 2 do art. 5.º-A do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril)
O dono de obra deverá exercer os seus direitos no prazo de três anos a contar da denúncia dos defeitos/desconformidade da obra (n.º 3 do art. 5.º-A do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril)
Quanto às soluções ao dispor do dono de obra, e que consubstancia os direitos que, em termos gerais, poderão exercer, prevê o n.º 1 do art. 4.º do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril que poderão passar pela
a) Reparação;
b) Substituição;
c) redução adequada do preço; ou
d) à resolução do contrato,
aos quais acrescerá o direito à indemnização.
Ainda que, ao contrário do que sucede no caso de o dono de obra ser um comerciante, inexista uma hierarquia tipificada e que deva ser seguida no que diz respeito às soluções aplicáveis (prevendo o n.º 5 do art. 4.º do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 08 de Abril, que “O consumidor pode exercer qualquer dos direitos referidos nos números anteriores, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito, nos termos gerais”), parte da jurisprudência tem entendido que o consumidor tem o “poder-dever” de, sempre que possível, exigir primeiramente a reposição da conformidade, pela reparação ou substituição, e apenas depois a redução do preço ou a resolução do contrato.
Assim, temos por claro que o legislador optou por permitir prazos mais extensos e exercícios de direito mais adaptados à parte fraca da relação jurídica em que o consumidor se encontra, em relação aos demais donos de obra que não consumidores, a quem é exigível um comportamento compatível com a sua posição enquanto profissional, inerente ao contrato celebrado.
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Notas finais:
1. O presente artigo é uma tentativa de simplificar o que não é simplificável devido à complexidade do tema, tratando a matéria de uma forma genérica e em termos abstratos.
2. O(s) regime(s) jurídico(s) aplicável(eis) às empreitadas te(ê)m diversas peculiaridades e é(são) de bastante complexidade, pelo que as situações deverão ser analisadas casuisticamente, existindo obrigações entre as partes e consequências em face das posturas adotadas, desde o momento em que é acordado o contrato de empreitada, em que a mesmo inicia, até ser aceite e findarem os prazos legalmente previstos.
3. Pois que, em bom rigor, existem diversos tipos de empreitadas, diversos tipos de reação no que concerne à entrega e aceitação da obra (que poderá ser com ou sem reserva), ou recusa da mesma, bem como diversos tipos de danos a considerar.
Bem como poderão as respetivas responsabilidades ser exigidas ao vendedor, ao empreiteiro ou ao subempreiteiro, mediante as concretas nuances a considerar, e os direitos a exercer variarão de caso para caso, ainda que sujeitos às regras gerais aqui enunciadas de forma leviana
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