O ano judicial corresponde, em bom rigor, ao ano civil. (cfr. n.º 1 do art. 27.º da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto)
Em face da necessidade de articular esforços no sentido de que a justiça não pare e, ao mesmo tempo, todos aqueles que se encontram direta ou indiretamente ligados à justiça possam gozar das férias, enquanto direito constitucionalmente previsto, a Lei determina a existência das chamadas “férias judiciais.”
Nesse sentido, determina o art. 36.º da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, que “Nos tribunais organizam-se turnos para assegurar o serviço que deva ser executado durante as férias judiciais”
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(Veja-se que “O direito a férias corresponde a um dos direitos (mais) essenciais dos trabalhadores, encontrando-se desde logo e por esse motivo previsto, no plano nacional, na al. d) do n.º 1 do art. 59.º da Constituição da República Portuguesa (e concretizado no Código do Trabalho nos arts. 237.º ss), e no plano internacional no art. 24.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, na al. d) do art. 7.º do P.I.D.E.S.C. e no n.º 3 do art. 2.º da Carta Social Europeia e Convenção OIT n.º 132/1970).
De acordo com o n.º 4 do art. 237.º do C.T., o direito a férias tem como escopo principal proporcionar ao trabalhador a recuperação física e psíquica, condições de disponibilidade pessoal, integração na vida familiar e participação social e cultural.”.
- cfr. https://www.tofadvogados.com/post/o-contrato-de-trabalho-e-as-f%C3%A9rias-do-trabalhador-marca%C3%A7%C3%A3o-gozo-e-vicissitudes
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Quanto à sua duração, determina o art. 28.º da Lei n.º 62/2013, de 26 de Agosto, que as férias judiciais decorrem de 22 de dezembro a 3 de janeiro, do domingo de Ramos à segunda-feira de Páscoa e de 16 de julho a 31 de agosto.
Ou seja, inicia amanhã, dia 16 de julho de 2022, o maior período de férias judicias existente no ano civil, que dura um mês e meio.
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Quanto às suas implicações relativamente a atos processuais, destacam-se o facto de que
a) Quanto à prática de atos processuais, durante as férias judiciais não são realizados, salvo citações, notificações, registos de penhoras e atos que se destinem a evitar danos irreparáveis; - cfr. n.º 1 e 2 do art. 137.º do C.P.C..
b) Quanto aos prazos processuais em curso (legais ou judiciais), suspendem-se durante as férias judiciais, salvo no âmbito de processos urgentes ou de duração superior a seis meses – cfr. n.º 1 do art. 138.º do C.P.C..
c) Quanto ao prazo para propor ações judiciais (de caducidade) no âmbito do C.P.C., aplica-se o regime previstos em supra b) – cfr. n.º 2 e 4 do art. 138.º do C.P.C..
De frisar que os prazos processuais referem-se à prática de atos a ser praticados no âmbito de um processo, ou à produção de efeitos jurídico-processuais (e não de ou em procedimento (extrajudicial)), podendo ser legais (determinados por lei), judiciais (determinados pelo Juiz), ou convencionais (determinados pelas partes), distinguindo-se dos prazos substantivos, que aqui não são relevados.
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Está assim evidenciada a principal relevância dos processos urgentes.
Sendo que, além de conforme verificado os prazos não se suspenderem nos períodos de férias judiciais; em regra têm inclusive prazos mais curtos para proferir despachos, promoções ou praticar atos de mero expediente pela secretaria, bem como para praticar atos pelas partes, como sucede para interpor recurso de decisões judiciais (v.g. n.º 1 do art.638.º do C.P.C. e n.º 2 do art. 80.º do C.P.T.); a prática dos atos precede o restante serviço judicial não urgente; e os meios de transmissão de comunicações são mais flexíveis, podendo inclusive utilizar-se a comunicação telefónica ou meio análogo de telecomunicações (cfr. n.º 5 do art. 172.º C.P.C. in fine).
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Exemplos de processos judicias com natureza urgente:
1. No âmbito do foro civil:
a) O processo de resolução de conflitos – cfr. n.º 3 do art. 111.º do C.P.C..
b) Os procedimentos cautelares – cfr. n.º 1 do art. 363.º do C.P.C..
c) O processo de maior acompanhado – cfr. n.º 1 do art. 891.º do C.P.C.
2. No âmbito da lei tutelar educativa:
a) Correm durante as férias judiciais os processos relativos a menor sujeito a medida cautelar de guarda em instituição pública ou privada ou em centro educativo ou a internamento para efeito de realização de perícia sobre a personalidade. – cfr. n.º 1 do art. 44.º da Lei n.º 166/99, de 14 de Setembro;
b) Quando a demora do processo puder causar prejuízo ao menor, o tribunal decide, por despacho fundamentado, que o processo seja considerado urgente e corra durante férias.
3. No âmbito do foro laboral:
a) A ação de impugnação da regularidade e licitude do despedimento;
b) A ação em que esteja em causa o despedimento de membro de estrutura de representação coletiva dos trabalhadores;
c) A ação em que esteja em causa o despedimento de trabalhadora grávida, puérpera ou lactante ou trabalhador no gozo de licença parental;
d) A ação de impugnação de despedimento coletivo;
e) As ações emergentes de acidente de trabalho e de doença profissional;
f) A ação de impugnação da confidencialidade de informações ou da recusa da sua prestação ou da realização de consultas;
g) A ação de tutela da personalidade do trabalhador;
h) As ações relativas à igualdade e não discriminação em função do sexo;
i) A ação de reconhecimento da existência de contrato de trabalho.
- cfr. n.º 1 do art. 26.º do C.P.T..
4. No âmbito de processo de insolvência:
a) O processo de insolvência, incluindo todos os seus incidentes, apensos e recursos. – cfr. n.º 1 do art. 9.º do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março;
b) Os registos de sentenças e despachos proferidos no processo de insolvência, bem como os de quaisquer atos de apreensão de bens da massa insolvente ou praticados no âmbito da administração e liquidação dessa massa ou previstos em plano de insolvência ou de pagamentos. – cfr. n.º 5 do art. 9.º do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março;
c) O processo especial de revitalização – cfr. n.º 3 do art. 17.º-A do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março;
d) O processo especial para acordo de pagamento – cfr. n.º 3 do art. 222.º-A do Decreto-Lei n.º 53/2004, de 18 de Março;
5. No âmbito do Regime Geral do Processo Tutelar Cível:
Correm durante as férias judiciais os processos tutelares cíveis cuja demora possa causar prejuízo aos interesses da criança.
- cfr. art. 13.º da Lei n.º 141/2015, de 08 de Setembro.
6. No âmbito do Processo Penal:
Determinam os n.ºs 1 e 2 do art. 103.º do C.P.P. que “Os actos processuais praticam-se nos dias úteis, às horas de expediente dos serviços de justiça e fora do período de férias judiciais (…), Excetuam-se do disposto no número anterior:”
a) Os atos processuais relativos a arguidos detidos ou presos, ou indispensáveis à garantia da liberdade das pessoas;
b) Os atos relativos a processos em que intervenham arguidos menores, ainda que não haja arguidos presos;
c) Os atos de inquérito e de instrução, bem como os debates instrutórios e audiências relativamente aos quais for reconhecida, por despacho de quem a elas presidir, vantagem em que o seu início, prosseguimento ou conclusão ocorra sem aquelas limitações;
d) Os atos relativos a processos sumários e abreviados, até à sentença em primeira instância;
e) Os atos processuais relativos aos conflitos de competência, requerimentos de recusa e pedidos de escusa;
f) Os atos relativos à concessão da liberdade condicional, quando se encontrar cumprida a parte da pena necessária à sua aplicação;
g) Os atos de mero expediente, bem como as decisões das autoridades judiciárias, sempre que necessário.
h) Os atos considerados urgentes em legislação especial.
Notas Finais:
1. Em relação a dúvidas que subsistissem quanto à prática de atos inseridos na tramitação de processos urgentes cujos prazos terminem em férias judicias, e com referência à interpretação do disposto no art. 137.º do C.P.C., decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, através de acórdão n.º 1/2021, de 11 de junho, que “Os actos inseridos na tramitação dos processos qualificados como urgentes, cujos prazos terminem em férias judiciais, são praticados no dia do termo do prazo, não se transferindo a sua prática para o primeiro dia útil subsequente ao termo das férias judiciais.”
2. Em relação à menção ao facto de que os prazos correm em férias judiciais e que se trata de um processo urgente, decidiu o Tribunal da Relação de Coimbra, no âmbito do processo n.º 4143/18.6T8VIS-B.C1, datado de 11/09/2020, que a “indicação de que se trata de processo de natureza urgente e de que, por isso, o prazo para a apresentação da defesa não se suspende em férias judiciais redunda na adopção de uma interpretação que não tem a mínima base de apoio na letra da lei, o que é vedado pelo art. 9º/2 do CC.”
E, como não podia deixar de ser,
a todos os Il. Colegas, bem como a todos todos aqueles que se encontram direta ou indiretamente ligados à justiça,
VOTOS DE BOAS FÉRIAS (JUDICIAIS)
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