Analisa, além do mais, os pressupostos para valorar a audição de menores como meio de prova no âmbito de processo tutelar cível.
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De entre os princípios que norteiam os processos tutelares cíveis temos a audição e participação da criança, a qual deverá ser efetuada com acompanhamento de adulto da sua escolha sempre que nisso manifeste interesse, salvo se o juiz recuse de forma fundamentada (cfr. al., c) do n.º 1 do art. 4.º do RGPTC).
Assim, no âmbito da audição de menores em processo tutelar cível, a presença dos advogados dos interessados pode ser afastada, quando justificada, em regra, pela sua idade, maturidade ou características pessoais (cfr. al. a) do n.º 4 do art. 5.º do RGPTC).
Já conforme decidiu o S.T.J., no âmbito do processo n.º 268/12.0TBMGL.C1.S1, datado de 14-12-2016, “A ponderação acerca da maturidade da criança terá de se revelar na decisão, só estando dispensada a justificação para a sua eventual não audição quando for notório que a sua baixa idade não a permite ou aconselha [e a] falta de audição da criança afecta a validade das decisões finais dos correspondentes processos por corresponder a um princípio geral com relevância substantiva, não sendo adequado aplicar-lhe o regime das nulidades processuais” – cfr. pontos V. e VI. do Sumário.
Ora,
No caso concreto, “o conteúdo da audição da menor, no que refere à sua opinião, não foi dado a conhecer aos progenitores, não foi obtido com observância do contraditório, nem foi submetido ao contraditório posterior à audição e antes da decisão, e nem sequer consta da decisão recorrida”.
Como é referido no respetivo aresto, “se o tribunal, depois de ter ouvido as crianças, para ter conhecimento da sua opinião, não transmite, ao menos no essencial (tudo aquilo que for necessário para que os progenitores se possam pronunciar com um adequado conhecimento de causa, sobre o que foi dito, para poderem influenciar a decisão do tribunal sobre o sentido da opinião da criança), essa audição aos progenitores, o resultado prático é o mesmo, isto é, é como se a audição não existisse”.
Para justificar a situação [e bem, na nossa opinião], são enunciados três pontos essenciais nos seguintes termos:
“Sendo que na transmissão do conteúdo da audição nada pode ser omitido, apesar da vontade em contrário do menor, visto que as normas do artigo 25 do RGPTC (ou do art. 88 da LPCJP) não o permitem, sob pena de violação do princípio do contraditório. O menor tem de saber – e ser avisado disso – que tudo o que disser e que tenha relevância para a decisão, tem de ser dado a conhecer aos interessados.
E também não é pretexto para a não cedência de partes dessa documentação, o eventual perigo que delas hipoteticamente possa decorrer para o menor. Primeiro, porque esse perigo não decorrerá, em princípio, da transmissão da documentação, mas da situação transmitida; segundo porque quer num ou noutro caso, o juiz ou o MP, a convencerem-se da existência dele, terão de tentar acautelar o risco de outro modo, designadamente, se for possível, através do uso das providências cautelares do art. 28 do RGPTC ou através dos meios da LPCJP. Terceiro porque se o conteúdo ou parte do conteúdo dessa audição convencer da existência de um perigo para os menores, esse conteúdo ou parte não pode ter deixado de influenciar fortemente a convicção do juiz e, por isso, tem de ser sujeito ao contraditório.”
Como tal, conclui o referido aresto que “Se a audição do menor, para além de expressar a sua opinião, tiver servido de meio de prova (art. 5/6-7 do RGPTC), o contraditório não podia ter sido afastado e, tendo-o sido, essa audição não pode servir de prova e a prova dos factos que se tiverem baseado nela fica prejudicada”.
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Sumário:
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I – A audição dos menores para exprimir a sua opinião sobre as questões que lhes dizem respeito (art. 4/1-c e 5/1 do RGPTC) é, em princípio, contraditória (com a presença dos advogados dos interessados), embora a presença dos advogados possa ser afastada se tal for justificado nos termos do art. 5/4-a do RGPTC.
II – A audição dos menores tem de ficar registada em acta (art. 155/7 do CPC) e, quando não tiver sido contraditória, deve ser dado conhecimento da mesma aos progenitores, sob pena de invalidade da decisão subsequente, e isso mesmo que os menores digam que não querem que esse conteúdo seja dado a conhecer aos progenitores. Não basta, pois, que, na decisão, o juiz refira que tomou em consideração a opinião dos menores.
III – Se a audição do menor, para além de expressar a sua opinião, tiver servido de meio de prova (art. 5/6-7 do RGPTC), o contraditório não podia ter sido afastado e, tendo-o sido, essa audição não pode servir de prova e a prova dos factos que se tiverem baseado nela fica prejudicada.
(…)
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