Analisa o destino de quantias monetárias apreendidas no âmbito de processo penal que tem por objeto a prática de crimes de abuso de confiança, em que não tenha sido deduzido pedido de indemnização civil pelos legítimos proprietários, mas em que estes estejam determinados.
Prevê o n.º 1 do art. 205.º do C.P., sob epígrafe “Abuso de confiança”, que “Quem ilegitimamente se apropriar de coisa móvel ou animal que lhe tenha sido entregue por título não translativo da propriedade é punido com pena de prisão até 3 anos ou com pena de multa”.
Por sua vez, em relação aos produtos e vantagens de facto ilícito típico, determina o art. 110.º do C.P. que
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1 - São declarados perdidos a favor do Estado:
a) Os produtos de facto ilícito típico, considerando-se como tal todos os objetos que tiverem sido produzidos pela sua prática; e
b) As vantagens de facto ilícito típico, considerando-se como tal todas as coisas, direitos ou vantagens que constituam vantagem económica, direta ou indiretamente resultante desse facto, para o agente ou para outrem.
(…)
6 - O disposto no presente artigo não prejudica os direitos do ofendido.
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Quanto à restituição de objetos apreendidos, determina o art. 186.º do C.P.P. que
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1 - Logo que se tornar desnecessário manter a apreensão para efeito de prova, os animais, as coisas ou os objetos apreendidos são restituídos a quem de direito ou, no caso dos animais, a quem tenha sido nomeado seu fiel depositário.
2 - Logo que transitar em julgado a sentença, os animais as coisas ou os objetos são restituídos a quem de direito, salvo se tiverem sido declarados perdidos a favor do Estado.
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Por fim, e com relevância para o caso em apreço, determina o art. 71.º do C.P.P. que “O pedido de indemnização civil fundado na prática de um crime é deduzido no processo penal respectivo, só o podendo ser em separado, perante o tribunal civil, nos casos previstos na lei”, encontrando-se este regime previsto nos arts. 71.º ss C.P.P..
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No caso em apreço, foram apreendidos aos respetivos autos determinadas quantias monetárias, de entre as quais €154.325.70 e € 40.155,85.
Através de decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância, as quantias foram declaradas perdidas a favor do Estado, em virutde de, no âmbito dos referidos autos, não ter sido apresentado pedido de indemnização civil pela herança legítima proprietária.
Não obstante, ficou provado no referido processo que tais quantias pertenciam à referida herança.
Ora,
Em suma, entendeu o Tribunal da Relação que, tendo ficado provado nos autos a identidade da legítima proprietária das quantias apreendidas nos autos, deveria ter sido oficiosamente ordenada a restituição das quantias à cabeça de casal da herança, não devendo tal ficar dependente da dedução de pedido de indemnização civil por parte desta.
E isto porque “em caso algum, a perda a favor do Estado pode prejudicar os direitos dos lesados ofendidos”
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Sumário
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Em caso de condenação pelo crime de abuso de confiança p. e p. pelo artigo 205.º do Código Penal, estando apreendidos nos autos valores de que o arguido se apropriou que comprovadamente pertencem aos lesados, devem os mesmos ser restituídos aos seus proprietários legítimos, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 186.º, n.º1 do Código de Processo Penal e 110.º, n.º6 do Código Penal, e não declarados perdidos a favor do Estado como vantagens da prática do crime.
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