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Foto do escritorTiago Oliveira Fernandes

Acórdão do T.R.Coimbra, proferido no âmbito do processo 18/18.7JAGRD-H.C1, datado de 07-05-2024

Analisa a prevalência entre o dever de sigilo profissional e o interesse na descoberta da verdade, no âmbito de processo cível.


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No âmbito de processo de inventário, uma das partes constituiu Advogado, tendo nesse processo sido apresentado acordo e elaborado mapa de partilha, sendo proferida sentença homologatória.

 

Posteriormente o Advogado constituído incompatibilizou-se com o Cliente, tendo este último constituído novo Advogado.

 

Posteriormente, foi instaurado por apenso ao processo de inventário recurso extraordinário de revisão, no âmbito do qual foi requerida a nulidade da transação homologada no inventário, para o que foi arrolado o Advogado inicialmente constituído como testemunha.

 

O Advogado escusou-se a depor, nos termos do disposto nas als. a) a c) do n.º 3 do art. 417.º do C.P.C., tendo o Juiz do Tribunal a quo considerado legítima a escusa, por este se encontrar abrangido pelo sigilo profissional previsto no art. 92.º do Estatuto da Ordem dos Advogados,

 

Consequentemente, e inconformado com tal decisão, foi suscitado incidente de quebra ou levantamento do sigilo profissional, nos termos do disposto no n.º 3 do art. 135.º do C.P.P., aplicável ex vi n.º 4 do art. 417.º do C.P.C..

 

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Ora,

 

Conforme explica o referido aresto,

“Mas se o direito à escusa a depor com fundamento no segredo profissional do advogado não é um direito absoluto, só em casos muito excecionais deverá ser quebrado e quando estejam em causa interesses altamente relevantes que não possam ser satisfeitos por outra via.

Devendo o conflito entre o interesse na descoberta da verdade e o dever de sigilo ser resolvido à luz do interesse preponderante ligado ao conceito de imprescindibilidade para a descoberta da verdade, ter-se-á de demonstrar que o interesse que se pretende proteger supera, de forma clara, o interesse fiduciário que se irá quebrar com a exigência de um depoimento forçado do advogado.

Sendo o apuramento de qual seja o interesse preponderante feito mediante a apreciação dos contornos do litígio em concreto, e atendendo-se a que o princípio da cooperação com o tribunal se destina aqui a acautelar interesses privados patrimoniais das partes (e não interesses públicos como sucede necessariamente em processo penal) analisemos o caso em apreço.”

 

Mais esclareceu que, quanto à imprescindibilidade da prova testemunha do respetivo Advogado, seria sempre possível fazer prova através de depoimento e de declarações de parte.

 

E, ainda que assim não fosse, mais frisou que  “não se vê como sustentar, num processo cível, a quebra do sigilo com a finalidade de depor contra o seu próprio cliente e num apenso de um processo onde o advogado, aí seu mandatário, se incompatibilizou com o cliente.”

 

Além do mais, frisando Augsuto Lopes Cardoso, “condição determinante para a análise de pedido de dispensa/quebra de segredo profissional é a verificação da defesa exclusiva do cliente. Nunca poderá um advogado prestar-se a depor contra anterior cliente e, com tal depoimento, prejudicá-lo”.

 

Conclui assim que “no conflito entre o dever de sigilo – cujos interesses no caso em apreço surgem em toda a sua dimensão, uma vez que, a par do interesse de interesse público relacionado com a função do advogado, surge aqui como premente a necessidade de proteção dos interesses do seu cliente – e o dever de cooperação com o tribunal, para apuramento de questões de carater patrimonial entre as partes, deverá prevalecer o dever de sigilo profissional” e, em conformidade, julgou improcedente o incidente de quebra do dever de sigilo.

 

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Sumário:

“I – Nunca pode ser autorizado o depoimento de advogado em processo principal ou em processo apenso, em que esteja, ou tenha sido, constituído mandatário judicial e ainda que tenha havido revogação ou renúncia ao mandato.

II – A incompatibilidade de papéis mais se agudiza quando é a parte contrária que pretende a sua audição, em conflito aberto contra os interesses do seu ex-cliente.

III – Consistindo o objeto do litígio averiguar da nulidade ou anulabilidade da transação celebrada no processo apenso, com fundamento na existência de erro do A./recorrente provocado pelo advogado, então seu mandatário e com quem se incompatibilizara, e indicado o mesmo como testemunha pela parte contrária, o dever de sigilo profissional deverá prevalecer sobre o interesse na descoberta da verdade, sendo de indeferir o pedido de quebra de tal sigilo formulado por esta.”            




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