Analisa a aplicação da al. c) do n.º 1 do art. 27.º do D.L. n.º 291/2007, de 21/8, no que diz respeito à deteção de substâncias psicotrópicas em caso de sinistro, uniformizando jurisprudência.
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O regime do sistema do seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel foi aprovado pelo Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto.
De acordo co o disposto na al. c) do n.º 1 do art. 27.º do referido diploma, “Satisfeita a indemnização, a empresa de seguros apenas tem direito de regresso (…) Contra o condutor, quando este tenha dado causa ao acidente e conduzir com uma taxa de alcoolemia superior à legalmente admitida, ou acusar consumo de estupefacientes ou outras drogas ou produtos tóxicos”.
Já em relação ao Código da Estrada, prevê o n.º 5 do art. 81.º do Decreto-Lei n.º 114/94, de 03 de Maio, que “Considera-se sob influência de substâncias psicotrópicas o condutor que, após exame realizado nos termos do presente Código e legislação complementar, seja como tal considerado em relatório médico ou pericial”, relevando aqui a Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio, e a Portaria n.º 902-B/2007, de 13 de Abril.
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No caso em apreço, ocorreu um acidente de viação, tendo das análises ao sangue efetuadas ao responsável pela ocorrência do sinistro sido detetada a substância psicotrópica THC.
A questão prende-se em saber, essencialmente, se para efeitos do direito de regresso da seguradora basta verificar-se a existência de substâncias, ou se é necessário provar o “estado de influenciação” pelo consumo de tal substância, havendo decisões proferidas pelos Tribunais Superiores em ambos os sentidos.
Em suma, e conforme entendimento preconizado no referido aresto, “a mera detecção de substâncias estupefacientes em exame de sangue não é suficiente para que se possa concluir pela diminuição efetiva da capacidade e aptidão física ou psíquica, o que apenas é viável com recurso a relatório médico e/ou pericial.”
(negrito nosso).
Sendo que é perfeitamente possível ser detetada a substância psicotrópica THC (ou outras), sem que as mesmas estejam a exercer qualquer alteração às faculdades do sujeito.
Aliás, facto que inclusive é explicado pelos Juízes Conselheiros, “pese embora tenha sido detectada a substância psicotrópica THC no exame de sangue do condutor, na quantidade de 0.8 ng/ml, o certo é que não resultou demonstrado que o condutor conduzia em “estado de influenciação” pelo consumo daquela substância psicotrópica (recordando aqui em especial que a ciência afirma que “valores abaixo de 2 ng/mL indicam ausência de influência [...] Para concentrações superiores a 2 ng/mL, foi observado prejuízo no desempenho de alguns, mas não todas as tarefas relacionadas com a condução”), o que, recorde-se mais uma vez, apenas seria possível demonstrar através de exame médico e/ou perícia”
Como tal, e transcrevendo o referido aresto, “(…) excluindo imediatamente a análise de eventual estado de influenciação pela detecção de 4.3 ng/ml de THC-COOH no exame de sangue, pois que este não é uma substância activa do ponto de vista farmacológico, seja em que quantidade for, não podendo concluir-se que a condução automóvel era feita sob influência de canabinoides, ainda que tenha sido detectada a presença de 0,8 ng/ml de THC (substância activa) no sangue do condutor, a verdade é que não consta dos autos a realização de exame médico e/ou pericial do qual resulte demonstrado que aquele mesmo réu conduzia, na data e local do acidente, sob influência de substâncias psicotrópicas ou que o valor detetado no exame de sangue era capaz, à luz dos conhecimentos científicos existentes na matéria, diminuir a capacidade física e psíquica do réu para o exercício da condução, o que seria determinante para o exercício do direito de regresso à luz do art. 27.º, n.º 1, alínea c), do DL n.º 291/2007, de 21-08.
Como resulta do que acima se deixou escrito, a demonstração de tal “estado de influenciação” era essencial ao sucesso da presente ação de regresso, competindo à seguradora a demonstração de que o condutor segurado deu causa ao acidente e que acusava, à data do acidente, consumo de substância estupefaciente com características, propriedades e em quantidade suscetíveis de influir na sua capacidade e aptidão física ou psíquica, o que, nos termos da legislação em vigor, apenas poderia ser feito através de exame e médico e/ou pericial e subsequente demonstração médica e/ou pericial nesse sentido.
Em consequência, foi uniformizada jurisprudência, no sentido de que
“Nos termos do artigo 27.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, para que seja reconhecido o direito de regresso à seguradora que satisfez a indemnização ao lesado, terá a mesma de alegar e provar que o condutor conduzia sob influência de substâncias psicotrópicas, diminuindo a aptidão física e mental do condutor para exercer a atividade da condução em condições de segurança, devendo tal “estado de influenciação” ser demonstrado através de exame médico e/ou pericial.”
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Sumário:
“Nos termos do artigo 27.º, n.º 1, alínea c), do Decreto-Lei n.º 291/2007, de 21 de agosto, para que seja reconhecido o direito de regresso à seguradora que satisfez a indemnização ao lesado, terá a mesma de alegar e provar que o condutor conduzia sob influência de substâncias psicotrópicas, diminuindo a aptidão física e mental do condutor para exercer a atividade da condução em condições de segurança, devendo tal “estado de influenciação” ser demonstrado através de exame médico e/ou pericial.”
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