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Foto do escritorTiago Oliveira Fernandes

Acórdão do S.T.J., proferido no âmbito do processo 26767/18.1T8LSB.L1.S1, datado de 30-11-2022

Analisa a relevância de declarações inexatas ou omissões no âmbito da contratação de seguros para efeitos de anulabilidade do contrato.


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O regime jurídico do contrato de seguro (RJCS) encontra-se publicado em anexo Decreto-Lei n.º 72/2008, de 16 de abril.


De acordo com o art. 1.º do RJCS, “Por efeito do contrato de seguro, o segurador cobre um risco determinado do tomador do seguro ou de outrem, obrigando-se a realizar a prestação convencionada em caso de ocorrência do evento aleatório previsto no contrato, e o tomador do seguro obriga-se a pagar o prémio correspondente.”


De entre os deveres de informação do tomador do seguro ou segurado, prevê o n.º 1 do art. 24.º do RJCS que “O tomador do seguro ou o segurado está obrigado, antes da celebração do contrato, a declarar com exactidão todas as circunstâncias que conheça e razoavelmente deva ter por significativas para a apreciação do risco pelo segurador.


Nesse seguimento, determina o n.º 1 do art. 25.º do RJCS que Em caso de incumprimento doloso do dever referido no n.º 1 do artigo anterior, o contrato é anulável mediante declaração enviada pelo segurador ao tomador do seguro.


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De frisar que, em relação ao dolo para efeitos dos preceitos legais acima mencionados, existe jurisprudência no sentido de que o dolo em causa no n.º 1 do referido art. 25.º não corresponde ao previsto no art. 253.º do Código Civil [“Entende-se por dolo qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação, pelo declaratário ou terceiro, do erro do declarante” (n.º 1)] – v.g. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, proferido no âmbito do processo 4317/13.6TBBRG.G1, datado de 09/11/2017 -, e no sentido de que corresponde ao previsto no art. 253.º do C.C., identificando como “dolo-artimanha” ou “dolo-negocial” v.g. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no âmbito do processo 1210/19.2T8MAI.P1, datado de 26/10/2020.


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Ora,



Entendeu o Supremo Tribunal de Justiça que, para que as declarações inexatas ou omissões determinem a anulabilidade do contrato, nos termos do disposto no n.º 1 do art. 25.º do RJCS, por violação do disposto da obrigação prevista no n.º 1 do art. 24.º do RJCS, é necessário que se verifiquem os seguintes requisitos:

- causalidade entre dolo e erro;

- essencialidade do erro para a celebração do negócio.



Tendo em consideração os referidos requisitos, bem como as regras de repartição do ónus da prova, decidiu o referido Tribunal que, no caso concreto, “o Segurado ter prestado informações inexactas com vista à celebração do contrato de seguro (ainda que referentes a circunstâncias que razoavelmente devia ter por significativas para a apreciação do risco, uma vez que constavam de questionário fornecido pela Ré seguradora quando da adesão), as mesmas não afectam a validade do contrato celebrado, uma vez que a Ré não alegou nem demonstrou que se tivesse conhecimento dos factos omitidos não teria celebrado o contrato de seguro ou tê-lo-ia celebrado noutras condições.”



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Sumário:

(…)

II - A importância da declaração inicial do risco no âmbito do contrato de seguro assume sentido atento o seu desígnio (que é o de transferir determinado sinistro para a seguradora mediante uma contrapartida) e consubstancia a relevância do princípio da boa-fé na fase pré-contratual, que impõe ao tomador do seguro ou ao segurado a obrigação de declarar com exactidão todas as circunstâncias que conheça e razoavelmente deva ter por significativas para a apreciação do risco pelo segurador, e à entidade seguradora, o dever de conduzir todo o processo negocial com lisura procedimental, em nome da tutela da confiança da contraparte (reflectida, quer na elaboração e teor do questionário, quer no esclarecimento do tomador ou segurado acerca da relevância do dever de informação exacta que sobre o mesmo impende).


III - As declarações inexactas ou omissões passíveis de determinar a anulabilidade do contrato, nos termos do artigo 25.º, do RJCS, terão de ser essenciais na contratação do seguro, ou seja, determinantes da vontade (viciada) de contratar o respectivo negócio, essencialidade que deverá ser alegada e demonstrada pela seguradora.


IV – Consequentemente, embora se encontre provado que o Segurado prestou informações inexactas com vista à celebração do contrato de seguro (ainda que referentes a circunstâncias que razoavelmente devia ter por significativas para a apreciação do risco, uma vez que constavam de questionário fornecido pela Ré seguradora quando da adesão), as mesmas não afectam a validade do contrato celebrado para efeitos de aplicação do regime previsto no artigo 25.º, do RJCS, uma vez que a Ré não alegou nem demonstrou que se tivesse conhecimento dos factos omitidos não teria celebrado o contrato de seguro, ou tê-lo-ia celebrado noutras condições.

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