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Foto do escritorTiago Oliveira Fernandes

A prescrição nas infrações rodoviárias

A ideia de que, decorridos 2 anos da prática de factos puníveis como contra-ordenação, previstos no Código da Estrada, a infração prescreve, é comum e prolifera pela sociedade.


Mas será bem assim?


De facto, prevê o n.º 1 do art. 188.º do Código da Estrada que “O procedimento por contraordenação rodoviária extingue-se por efeito da prescrição logo que, sobre a prática da contraordenação, tenham decorrido dois anos.”


No entanto, esta norma não poderá ser interpretada de forma isolada, devendo ser enquadrada de acordo com as regras previstas no regime geral de contra-ordenações e coimas (Decreto-Lei n.º 433/82, de 27 de Outubro), doravante designado por RGCO, de acordo com a harmonia e coerência intrínseca à unidade do sistema.


E, ainda que dúvidas subsistissem quanto a essa realidade, tal seria dissipado pelo n.º 2 do referido art. 188.º, o qual prevê de forma inequívoca a aplicação das regras da suspensão e interrupção do prazo de prescrição em análise previstas no RGCO, aditando inclusive – ainda que de forma irrelevante – uma outra causa de interrupção. (“Sem prejuízo da aplicação do regime de suspensão e de interrupção previsto no regime geral do ilícito de mera ordenação social (…)”).


Em conformidade, determina o n.º 1 do art. 28.º do RGCO que o prazo de prescrição aplicável se interrompe nas seguintes situações:

“a) Com a comunicação ao arguido dos despachos, decisões ou medidas contra ele tomados ou com qualquer notificação;

b) Com a realização de quaisquer diligências de prova, designadamente exames e buscas, ou com o pedido de auxílio às autoridades policiais ou a qualquer autoridade administrativa;

c) Com a notificação ao arguido para exercício do direito de audição ou com as declarações por ele prestadas no exercício desse direito;

d) Com a decisão da autoridade administrativa que procede à aplicação da coima.”


Verificadas estas situações, nas quais se incluem, a título meramente exemplificativo, a notificação para exercício de direito de audição ou para proceder ao pagamento voluntário da coima, para efetuar a consulta do processo, do envio de prova fotográfica devidamente solicitada, a inquirição de testemunhas devidamente arroladas, ou proferida a decisão (independentemente de esta ter sido notificada ou não), o referido prazo de 2 anos reiniciará a partir desse momento.


Já o n.º 3 do referido artigo prevê que, independentemente das interrupções a que haja lugar no caso concreto, a prescrição verificar-se-á quando decorrido o prazo de prescrição (2 anos) acrescido de metade (1 ano). Ou seja, decorridos um máximo de 3 anos a contar da prática dos factos imputados.


O mesmo é dizer, se o arguido for notificado da contraordenação decorrido pelo menos 1 ano da prática dos factos, o prazo de prescrição verificar-se-á sempre decorridos 3 anos da prática dos factos, sendo as demais causas de interrupção irrelevantes face ao limite máximo aplicável de 3 anos.


Existem ainda casos de suspensão do prazo de prescrição, previstos no n.º 1 do art. 27.º-A do RGCO.


A sua aplicação para as situações em análise reverte importância essencialmente no caso de o arguido optar por impugnar judicialmente uma decisão administrativa, determinando a suspensão do referido prazo de prescrição por um período máximo de 6 meses, nos termos do n.º 2 do referido artigo.


A existência deste prazo de prescrição tem na sua génese, por um lado, o direito de o arguido ser julgado num prazo razoável, devendo o procedimento ocorrer de forma célere e evitando tornar progressivamente sem sentido os efeitos úteis da sanção; e, por outro, com a necessidade de autolimitação do Estado face ao decurso do tempo, num pressuposto de esquecimento da conduta ilícita por parte da comunidade.


Algumas das causas de interrupção e suspensão do prazo de prescrição dependem de uma postura ativa por parte do arguido, determinado que a entidade administrativa adote determinados comportamentos sob pena de nulidade (que em devido tempo terá de ser arguida, sob pena de se considerar sanada). No entanto, esta postura ativa terá que ser efetuada nos termos e condições legalmente previstas, sob pena de serem inoperantes, pelo que é indispensável a consulta e acompanhamento do processo por parte de um profissional idóneo, com competência para tal.


Concluindo, o prazo de prescrição do procedimento contraordenacional rodoviário poderá ocorrer decorridos mais de 2 anos da prática dos factos, dependendo do comportamento adotado, quer por parte de entidades administrativas e judiciais, quer por parte do arguido. Como tal, o prazo de prescrição poderá verificar-se, até ser proferida decisão final administrativa, decorridos que sejam um máximo 3 anos da prática dos factos, ou, caso o arguido opte pela impugnação judicial, decorridos que sejam um máximo de 3 anos e seis meses da prática dos factos.

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