As relações familiares abrangem um conjunto amplo de direitos e deveres mútuos, que vão para além do dinheiro e do amor.
Em termos abstratos, prevê desde logo o n.º 1 do art. 1874.º do C.C. que “Pais e filhos devem-se mutuamente respeito, auxílio e assistência.” Já no que diz respeito aos deveres dos pais para com os filhos, objeto de análise no presente artigo, dispõe o art. 1877.º do C.C. que “os filhos estão sujeitos às responsabilidades parentais até à maioridade ou emancipação”, e o n.º 1 do art. 1878.º do C.C. que, com referência ao conteúdo das responsabilidades parentais, “Compete aos pais, no interesse dos filhos, velar pela segurança e saúde destes, prover o seu sustento, dirigir a sua educação, representá-los, ainda que nascituros, e administrar os seus bens”, tratando-se de deveres irrenunciáveis (cfr. art. 1882.º do C.C.).
Neste segmento, determina o n.º 1 do art. 1885.º do C.C. que “Cabe aos pais, de acordo com as suas possibilidades, promover o desenvolvimento físico, intelectual e moral dos filhos”.
É certo que, na constância do casamento, o exercício das responsabilidades parentais pertence a ambos os pais (cfr. art. 1901.º do C.C.) e, como tal, nessa situação inexistirá em princípio qualquer problema.
No entanto, em caso de divórcio ou separação dos pais – e ignorando neste artigo o regime de “guarda partilhada”, por transcender o objeto de análise – os alimentos devidos aos filhos e a forma de os prestar terá de ser regulada por acordo entre os pais e sujeito a homologação, sempre mediante pronúncia prévia por parte do Ministério Público, por forma a averiguar que o respetivo acordo acautela o superior interesse do menor.
Este acordo poderá ser promovido quer por um dos progenitores (pois, não estando casados, o Estado não poderá atuar oficiosamente, por desconhecimento dos factos subjacentes à sua atuação) ou, em caso de divórcio, quer por mútuo acordo, quer pela via litigiosa, deverá ser acordado obrigatoriamente (cfr. art. 931.º do C.P.C. e artigos 1909.º e al. b) do n.º 1 do art. 1775.º do C.C., e art. 45.º e seguintes do Regime Geral Do Processo Tutelar Cível (RGPTC)).
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Quanto aos critérios de determinação do concreto montante, no ordenamento jurídico Português inexiste uma tabela legal aplicável ou uma fórmula prevista, não obstante haver orientações doutrinárias que consideram factos objetivos para determinar um montante concreto, como por ex. do Reino Unido e de Espanha que, analogamente, poderão ser consideradas.
Concretamente, na legislação nacional determina de forma abstrata o art. 2003.º do C.C. que “Por alimentos entende-se tudo o que é indispensável ao sustento, habitação e vestuário (…) [compreendendo “(…) também a instrução e educação do alimentado no caso de este ser menor”., e o art. 2004.º do C.C. que “Os alimentos serão proporcionados aos meios daquele que houver de prestá-los e à necessidade daquele que houver de recebê-los”.
Trata-se de um montante que será pago, em regra, em prestações pecuniárias mensais pelo progenitor com quem o menor não fique a residir habitualmente.
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Esta prestação pecuniária a que corresponde a vulgarmente denominada “pensão de alimentos” tem algumas peculiaridades cuja importância releva enunciar.
Assim, sendo uma decorrência de diversas normas constitucionais, das quais releva a obrigação de os pais educarem e manterem os filhos (n.º 5 do art. 36.º da C.R.P.), trata-se desde logo de uma prestação indisponível e irrenunciável (cfr. art. 2008.º do C.C.).
Em face da importância subjacente ao seu cumprimento, está abrangida por dois meios específicos de execução, bastante mais céleres que os comuns, caso se verifique o seu incumprimento, v.g., execução especial por alimentos, p. no art. 933.º do C.P.C. e seguintes, e regime especial de tornar efetiva a prestação de alimentos, p. no art. 48.º do RGPTC.
Quanto aos montantes penhoráveis, ao contrário do que sucede com as demais obrigações, em que a impenhorabilidade tem como limite mínimo, quando seja o único rendimento, o montante equivalente a um salário mínimo nacional, no caso de a dívida dizer respeito a alimentos devidos será impenhorável a quantia equivalente à totalidade da pensão social do regime não contributivo, ou seja, o equivalente ao I.A.S. (indexante de Apoios Sociais), que atualmente corresponde a €438,81.
Por outro lado, a violação da obrigação de prestar alimentos tem ainda como consequência a instauração de processo crime, caso seja apresentada queixa-crime nos termos legais, prevendo o art. 250.º do Código Penal que “Quem, estando legalmente obrigado a prestar alimentos e em condições de o fazer, não cumprir a obrigação no prazo de dois meses seguintes ao vencimento, é punido com pena de multa até 120 dias”, sendo que a prática reiterada de tal conduta poderá determina a aplicação de uma pena de prisão até um ano. Por outro lado, estando os progenitores em condições de pagar os alimentos, ou colocando-se nessa situação com esse intuito, “pondo em perigo a satisfação, sem auxílio de terceiro, das necessidades fundamentais de quem a eles tem direito”, poderá ser punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias.
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No mais, estando em causa assegurar as necessidades e o bem-estar dos menores, verificados que estejam alguns pressupostos – v. g. “Quando a pessoa judicialmente obrigada a prestar alimentos a menor residente em território nacional não satisfizer as quantias em dívida pelas formas previstas no artigo 189.º do Decreto-Lei n.º 314/78, de 27 de outubro, e o alimentado não tenha rendimento ilíquido superior ao valor do indexante dos apoios sociais (IAS) nem beneficie nessa medida de rendimentos de outrem a cuja guarda se encontre, o Estado assegura as prestações previstas na presente lei até ao início do efetivo cumprimento da obrigação” (cfr. n.º 1 do art. 1.º da Lei n.º 75/98, de 19 de Novembro) poderá o progenitor com quem o filho resida solicitar a intervenção do Fundo de Garantia de Alimentos Devidos a Menores, assumindo assim por esta via o Estado essa obrigação.
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Por fim, não podemos deixar de frisar que os deveres e direitos a que os progenitores se encontram adstritos não podem ser derrogados com fundamento no incumprimento de outros por parte dos progenitores.
Assim, ainda que o progenitor obrigado a prestar alimentos não os preste, incumprindo com essa obrigação, terá sempre o direito/dever de visitar e estar com os filhos menores. Se tal direito/dever for impedido pelo outro progenitor, haverá um incumprimento mútuo das responsabilidades parentais, podendo determinar a aplicação de sanções pecuniárias e cumprimentos coercivos, bem como poderá fundamentar uma eventual alteração do regime fixado quanto à regulação do exercício das responsabilidades parentais. (cfr. arts. 41.º e 42.º do RGPTC).
Por outro lado, ainda que seja decretada a inibição do exercício das responsabilidades parentais, nos termos do disposto nos arts. 1913.º e seguintes do C.C. e art. 52.º e seguintes do RGPTC, manter-se-á a obrigação dos progenitores alimentarem os filhos.
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Nota final: O presente artigo ignora propositadamente o regime aplicável à guardar partilhada e os alimentos devidos a filhos maiores, os quais, ainda que partilhem em geral do mesmo regime e da mesma tutela legal que os alimentos devidos a filhos menores, têm algumas particularidades que justificam um tratamento autónomo.
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